sexta-feira, 18 de abril de 2014

SEXTA-FEIRA DA PAIXÃO DO SENHOR (Meditação para a sexta-feira Santa)

Eis o lenho da Cruz do qual pendeu a salvação do mundo é essa verdade que acolhemos na Celebração da Paixão do Senhor, enquanto o preside proclama cantando-a de modo ascendente, a comunidade reunida confirma, respondendo: Vinde, adoremos. Ou seja, do madeiro da cruz o Senhor nos libertou dos nossos pecados e culpas.
            A liturgia celebrada pela Igreja, neste dia santo, tem um caráter de despojamento, de entrega, de oferta. O centro do Mistério que celebramos, Cristo, oferta toda a sua vida ao Pai, não poupando-se a si mesmo, mas totalmente despojado, humilhado entrega-se à plenitude do projeto de Deus para resgatar a humanidade da morte, da dor, da escravidão e, com isso, configurá-la a uma nova realidade histórica, a qual é convidada a experimentar  a salvação de Deus.
            Escolhi o texto bíblico: Cristo, Servo de Deus, da Carta aos Filipenses, capítulo 2, versículos 6-11, uma vez que este nos apresenta a realidade ofertorial de Jesus na sua entrega despojada na árvore bendita da Cruz:

Embora fosse de divina condição, Cristo Jesus não se apegou ciosamente, a ser igual em natureza a Deus Pai.  Porém esvaziou-se de sua glória e assumiu a condição de um escravo, fazendo-se aos homens semelhante. Reconhecido exteriormente como homem, humilhou-se, obedecendo até à morte, até à morte humilhante numa cruz.Por isso Deus o exaltou sobremaneira, e deu-lhe o nome mais excelso, mais sublime, e elevado muito acima de outro nome. Para que perante o nome de Jesus, se dobre reverente todo joelho, seja nos céus, seja na terra ou nos abismos. E toda língua reconheça, confessando, para a glória de Deus e seu louvor: ‘Na verdade Jesus Cristo é o Senhor!’

Jesus, totalmente Deus; Jesus, totalmente Homem. Como nos apresenta o Evangelista João, no canto da encarnação: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus[...] E o Verbo se fez carne e habitou entre nós; e nós vimos a sua glória, glória que ele tem junto ao Pai como Filho único, cheio de graça e de verdade.” (Jo 1, 1. 14). Jesus foi um homem totalmente livre, tão livre ao ponto de não apegar-se à sua natureza divina. Sendo Deus, não se autodefendeu do cálice pelo qual deveria passar, mas livre e despojadamente levou a termo à missão que o Pai lhe confiara.
Jesus, em tudo foi igual aos homens, exceto no pecado. Esvaziou-se daquilo que era em-si para assumir uma condição que não lhe era própria, mas para fazer-se um com todos e para sentir as dores do povo, ao qual veio libertar, tornou-se vítima pelos nossos pecados. Assim, Jesus “[...] unindo a si tudo o que é humano, aceitando também os vazios e as ambiguidades do nosso dizer [...] declarando sua, desde sempre, a realidade assumida [...]”[1]. Ele fez-se homem para libertar a nossa humanidade propensa ao pecado.
Veio para relevar-nos o Rosto do Pai e, com isso, restaurar o Projeto do Amor de Deus para a humanidade, já que pela desobediência do pecado, nos afastamos e desconfiguramos a concretude desse mesmo Projeto. Jesus, o homem obediente, deixou-se conduzir pelo Espírito, desde o Jordão até o Gólgota. Como nos diz Perego: “O eco entre a cena do batismo e a morte de Jesus, como também a ligação com alguns do Antigo Testamento, conferem um significado teológico particular à ‘consagração’ de Jesus: esta é inaugurada no Jordão, mas seu cumprimento acontece no Gólgota, no final de sua existência terrena. A condição humana assumida até a morte de cruz torna-se o lugar a partir do qual o Espírito se infunde sobre todas as criaturas, justamente como, na abertura, o mesmo Espírito descera sobre Jesus”[2].
Portanto, caro/a irmão/ã, mergulhemos em tão grande mistério de amor... O sacrifício de Jesus - sacrifício perfeito e santo - nos ajuda a compreendermos os nossos pequenos sacrifícios diários, as pequenas cruzes que a vida nos pede de carregá-las. Não nos fechemos em nosso egoísmo e, muito menos, não nos esquivemos de sermos também nós, oferendas vivas para que o amor de Deus se plenifique em cada coração humano.
Servir e amar. Amar e servir, sempre e em qualquer lugar. A vida toda de Jesus foi amor e serviço, o seu manto real foi o avental, e a sua maior prova de amor foi ter dado a sua própria vida para ‘pagar a conta’ que, por nós mesmos não conseguiríamos ‘pagá-la’ com o Pai. Assim, a imolação de Jesus foi “como um ato de ‘imersão plena’ na História e nas vicissitudes da humanidade, assumidas e vividas até o fundo, redimidas pela lógica do despojamento e do dom total de si”[3].
Como Jesus, despojemo-nos, despojemo-nos, despojemo-nos. Eis o segredo para a felicidade em Deus. Parece-nos contraditório, mas não o é. Despojar-se e entregar-se, por amor, em favor dos irmãos são as atitudes próprias de conformação a Cristo, Servo de Deus.
Ó Bendita cruz, ó adorável cruz, te adoramos Santa Cruz!

André Vinícius Mendes de Sá
Noviço dos Religiosos da S. Face


[1] (PEREGO, Giacomo. Novo Testamento e Vida Consagrada, pp. 49-40).
[2] (PEREGO, Giacomo. Novo Testamento e Vida Consagrada, pp. 58-59).
[3] (PEREGO, Giacomo. Novo Testamento e Vida Consagrada, p. 59).

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